segunda-feira, 16 de maio de 2011

Beijupira e Aqualide a Fechão as Portas em Pernambuco

UM PROJETO QUE NAUFRAGOU

ALTO MAR A Aqualider, a primeira fazenda marinha de criação de pescados do Brasil, encerrou as suas atividades em outubro de 2010
Giovanni Sandes
gsandes@jc.com.br

Dez milhões de reais e cinco anos de trabalho se dissolveram em alto mar, a 11 quilômetros da costa da Praia de Boa Viagem. A distância é o mesmo número de “pontos críticos” apontados pela pernambucana Aqualider ao relatar ao JC, ontem, o naufrágio melancólico de seu negócio, ano passado, em época de eleições presidenciais. A Aqualider fechou em silêncio, depois de ter recebido até o ex-presidente Lula no lançamento da primeira fazenda marinha de criação de peixes do Brasil, em 1º de fevereiro de 2009. A escolha foi pelo nobre peixe beijupirá.
Os motivos alegados para o fechamento da empresa vão da má qualidade da ração fornecida no Brasil a problemas ambientais e até um acidente com um barco de terceiros (leia matéria abaixo).
A Aqualider criou larvas de camarões até 2004. Saiu do negócio quando os Estados Unidos investigaram supostas práticas anticompetitivas de empresas brasileiras no mercado de crustáceos. A empresa começou a saga pela fazenda marinha, formato inédito no Brasil.
A criação continental de peixes não atingiria um volume industrial. Era preciso seguir o exemplo do Chile, Noruega e até Taiwan. Depois de encarar uma infinidade de cadeiras de espera em órgãos públicos, em 2008 o governo licitou a concessão de 169 hectares em Pernambuco, levada pela Aqualider.
A empresa organizou a tecnologia e buscou funcionários. Envolveu a Universidade Federal Rural de Pernambuco (UFRPE) e pescadores de Brasília Teimosa a Barra de Jangada. Os filhotes de peixes, conhecidos como alevinos, eram criados em tanques em terra firme, para engorda em alto mar.
Foram instalados quatro tanques-rede. Seriam 48, ao custo de US$ 35 mil cada um, na época. O quilo do peixe seria vendido a R$ 15. O beijupirá chega, em um ano, a pesar 15 quilos. Em três anos de operação, seriam 10 mil toneladas de peixe.
Lula veio para a cerimônia de lançamento da Aqualider com três ministros, além do governador Eduardo Campos, e até alimentou os peixes.
Em 2009, a produção foi maior que o esperado: em vez de 40 toneladas, foram 60 toneladas, todas vendidas. Ano passado, porém, zero real foi comercializado.
O empresário Manoel Tavares, dono do negócio, diz que não foi o câmbio que afundou a Aqualider.
Ele também diz que primeiro consultou o Ministério da Pesca e Aquicultura (MPA) sobre dificuldades no negócio, antes de comunicar, em outubro passado, o fechamento da empresa. “Não queria fechar um projeto inaugurado por Lula, por quem tenho apreço pela visão de criar o próprio MPA, responsável pelo estabelecimento do marco legal da exploração privada de águas públicas”, diz Manoel Tavares.
PRODUTOR CRITICA GESTÃO AMBIENTAL
O empresário Manoel Tavares, da Aqualider, critica a gestão ambiental no Brasil. Cita um suposto erro da Agência Estadual de Meio Ambiente e Recursos Hídricos (CPRH), mas elogia o governo federal. Deixa transparecer a razão do fechamento silencioso da sua empresa e das loas ao Ministério da Pesca e Aqüicultura: defende ajuda pública para a atividade nos primeiros anos, para o setor depois seguir sozinho.
Segundo ele, o principal problema do negócio em uma lista de 11 pontos apresentada ao governo foi a qualidade da ração, 60% do custo de produção. Basicamente, o negócio é transformar ração em peixe”, explica.
seguidos problemas de qualidade – até mofo –, em lotes diferentes de ração. A maioria dos lotes foi devolvida, mas a demora também representa custo.
Outro ponto seria a dragagem do Porto do Recife, realizada entre 2009 e 2010 pela Serviços de Operação Marítima, braço do grupo holandês Van Oord. Segundo Tavares, o material dragado era jogado em alto mar, contaminando os peixes com herbicidas, pesticidas e plástico. A culpa seria da CPRH – procurado, o órgão informou nunca ter recebido qualquer denúncia a respeito do assunto.
Manoel Tavares comenta ainda que perdeu R$ 2 milhões porque uma embarcação invadiu a área demarcada e colidiu com a fazenda marinha, liberando 40 mil peixes no mar e destruindo equipamentos. “Pelo menos não houve feridos, relata. Até hoje, o empresário briga na Justiça para ser ressarcido.
Para cada um dos 11 pontos críticos, apresentamos uma sugestão, como abertura total do mercado de ração. Apostei em uma empresa com recursos próprios, sem ajuda do governo. Mas em todos os países onde a aquicultura evoluiu, como o salmão no Chile e a corvina na França, o governo deu enorme subsídio”, comenta.
Tenho sido contatado pelo MPA para reabrir as portas. Dependendo do formato, isso seria possível”, afirma Tavares.
Publicado no JC - Cardeno Comercio de 11/05/2011 - Pag. 03